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Obra retratando uma batalha inspirada na vida do Profeta Maomé, que é representado na obra sem o rosto, uma orientação do islã.

Acervo do MIAN  (Museu Internacional de Arte Naïf do Brasil - Rio de Janeiro).

ORIGEM: https://www.facebook.com/MuseuNaif/?fref=ts

OS OLHOS NAÏFS SE VOLTAM PARA O ORIENTE (ATÉ SÉCULO XXI)

 

O século XIX foi marcado, principalmente, pela revolução industrial, com forte impacto na vida da população no mundo inteiro, nos transportes, na produção mais rápida de produtos, com preços mais baixos e a diminuição das distâncias, porém a evolução tecnológica não acompanhou a evolução social e muitos países da África, América Latina e na Ásia ainda eram submetidos ao poder político e econômico dos países da Europa. Sabemos que a África do Sul, o Egito, a Índia e China até meados do século XX, foram tratados como um quintal da Inglaterra, ou seja, eram tratadas políticamente como colônias da Inglaterra.

Na vida cultural da Europa, a produção artística dos povos considerados menos desenvolvidos era vistas como arte exótica, em alguns momentos na história da arte europeia, a arte de outros países viraram moda, como a porcelana chinesa, os tecidos e especiarias da Índia, o marfim da África, a madeira do Brasil, utilizada em móveis de luxo. Na segunda metade do século XIX essa visão começa a mudar, e o que antes era considerado exótico, aos poucos vai sendo considerado como a mais espontânea expressão de arte. Por volta de 1860 a Estamparia Japonesa cai no gosto popular dos europeus, principalmente dos franceses, alguns artista colecionaram as coloridas Estamparias Orientais, como Vincent van Gogh, que chegou a reproduzir algumas delas com a sua técnica, Paul Gauguin levou para seus temas o povo do Taiti, com o seus costumes e colorido, Claude Monet, leva para seus temas aquáticos as ninféias e barcos flutuando sobre a água escura, numa clara influência da arte asiática, tanto Chinesa como Japonesa. Até mesmo Henri Rousseau, na última fase de sua carreira, foi buscar o tema das selvas o colorido natural para a agressividade dos temas abordados por suas obras. Depois de um período de dominação política e religiosa, alguns países voltaram a ter a liberdade política e criativa, mas as influências artísticas e culturais se mantiveram em todos os aspectos, tanto dos países imperialistas como das ex-colônias.

A elite cultural na Europa começa a valorizar as Iluminuras Orientais e as Estamparias Asiáticas como obra de arte, comparável com a produzida ao longo da história da arte na Europa. È muito comum encontrarmos obras produzidas por artistas não europeus, por tanto não civilizados, no ponto de vista da sociedade da época, em museus da Europa.

Artista Anônimo - Oferenda - Índia - (1985)

Acervo do MIAN  (Museu Internacional de Arte Naïf do Brasil - Rio de Janeiro).

ORIGEM: https://www.facebook.com/MuseuNaif/?fref=ts

A primeira produção a ser abordada nesse capítulo é a arte de origem árabe, principalmente a pintura figurativa, que irá influenciar a pintura na Índia e nas mais diversas regiões do mundo. É muito importante ressaltar que nos países onde a religião muçulmana é seguida pela maioria da população temos a influência da orientação religiosa na arte.

O Alcorão, livro sagrado no Islã prega a proibição da produção de imagens, mesmo em obras de arte, pois elas podem ser vistas como símbolos de idolatria, mas mesmo assim, nós podemos encontrar imagens em algumas regiões, analisando pela geografia.

Podemos analisar a influência da religião na arte árabe através dos povos que a produzem. A preferência pelos temas puramente geométricos, abstratos e vegetais é mais visível nos muçulmanos seguidores da seita Sunita, que segue o Alcorão ao pé da letra, mas já no universo dos crentes da seita Xiita existe uma relativa liberdade do pensar. Deste ponto de vista o islã está dividido pela linha do Eufrates, pois são Xiitas a maior parte dos seguidores na Pérsia e da Índia, enquanto os Sunitas predominam na Síria, na África do Norte e no Mar Mediterrâneo como na costa da Espanha e na Sicília. A Influência do Islã nessas regiões se deu pela expansão militar, pois sabemos que muitas das regiões citadas já fizeram ou passaram pelo domínio árabe, que ditavam as regras e governavam os povos dominados. No caso da Índia já existia uma rica produção de pintura mural, o que aconteceu foi a fusão das duas culturas, o artista árabe vinha com a inovação técnica, com novas químicas de tintas e a cultura hindu com o exótico colorido e a sensualidade dos deuses, que agora não poderiam ser temas, das obras que eram destinadas aos ambientes frequentados pelos seguidores do islã, porém ao decorrer da convivência houve uma liberdade e as pinturas com temas indianos continuaram a ser produzidas, houve uma troca de informações e de técnicas.

Período Timúrida, Behzad, A um Pobre é Recusado o Acesso à Mesquita, 1486. Iluminura de um manuscrito do Bostan(colecção de poemas narrativos) de Sa'di, proveniente de Herat. Gouache, tinta-da-china e ouro sobre papel.

ORIGEM:(http://quizlet.com/8614025/survey-of-art-final-study-guide-flash-cards/)

Um comentário é necessário para compreender a influencia da religião na arte, pois do Eufrates rumo ao Ocidente ou a Oeste, vemos temas mais geométricos, abstratos e vegetais, nas decorações dos palácios, na arquitetura e na pintura. No Eufrates partindo para o extremo Oriente rumo a Índia e seguindo a Antiga Rota da Ceda, chegamos ao Oeste da China, onde vemos uma tolerância maior à produção de arte com figuras de homens e animais. Na Índia, a arte de origem árabe chega a influenciar a pintura em tábua e as ricas iluminuras dos livros de contos, e ainda nos retratos dos Rajás e Sultões. Algumas obras muito me chamaram a atenção como duas Iluminuras da Escola de Herat, que está no Museu Britânico de Londres, no qual uma representa o jogo de pólo e na outra uma cena de caça a cavalo, são obras do século XV. As Iluminuras da Escola de Herat são famosas e tem um ponto em comum com outras iluminuras de origem árabe, as figuras estão sempre em movimento, e existe um frescor do colorido e da composição, são cenas tiradas do cotidiano, características tão comuns na pintura Naïf contemporânea. Já na Iluminura Hindu o destaque vai para a obra O Retrato do Xá Djahan, feito por volta de 1630, e é uma iluminura Hindu do período Mongol. Ela está no museu Victoria and Albert Museum de Londres. A Biblioteca Nacional de Paris guarda em seu acervo outra grande iluminura Hindu feita no século XVIII e que tem uma inscrição Bolaqvi, onde podemos observar um nobre sendo alvo das atenções de suas 24 mulheres, que o alimentam, tocam música, dançam e fazem companhia, tudo para ele. O rico colorido, as estampas das roupas, as flores dos tapetes e a cena do cotidiano, são características que são comuns na pintura Naïf contemporânea.

Os homens de poder como os Sultões e Rajás gostavam de ser retratados entre suas mulheres, seus músicos e poetas, é pouco comum em cenas de guerra ou em outros locais, as iluminuras mostram os poderosos vivendo a vida, caçando, jogando e se divertindo em festas com suas belas mulheres pisando em coloridos tapetes é o que vemos em outra Iluminura da época Islâmica, feita em Utaipur (Udaipur), no século XVIII. Representa com um sentido da perspectiva originalíssima e pormenores reveladores dos costumes da época e da região, onde um nobre marajá com sua esposa e servidoras rumam ao terraço do palácio, onde encontramos uma cama preparada, num plano mais baixo, em meio a um jardim particular, onde as folhas das árvores parecem ter sido pintadas uma a uma, dois músicos tocam para alegrar a noite, numa cena que nos leva a crer que se trata de uma noite de núpcias. A obra pode ser encontrada no Museu Victoria and Albert Museum de Londres.

O MIAN (Museu internacional de Arte Naïf do Brasil no Rio de Janeiro) tem em seu acervo a arte Naïf obras produzida em países de orientação Islâmica e hindu, feitas num período mais recente, é o caso das obras Rajasthan, da índia, de autor anônimo feita no século XVIII, com um tema de caça. Em outra obra podemos observar A caça do tigre, da Birmânia, feita no século XVIII, por um artista anônimo. A obra O Tigre de Jaipur Ram Khushi pintada em 1970 de Benares e a obra Mulher entre Pavões de artista anônimo, ambos são da Índia, mas podemos encontrar também a obra Elefantedragão de Bhupindra lal feita em Bangladesh e a obra Casal vendo televisão de Mourry Léonard da Argélia. Da Líbia vemos a obra Pastores feita por E. Iulas. Da Síria vemos a obra O Rei e a Rainha de artista anônimo e para finalizar a obra Meu Vilarejo Natal feita no Marrocos pela artista Fátima Najem.

Livro ilustrado de poesia tailandesa - (Por volta dos anos 1850 d.C. e 1899 d.C.)

ORIGEM: http://identidade85.blogspot.com.br/2014/05/algumas-historias-orientais-atraves-da.html

A INGENUIDADE NA ARTE DA CHINA E EXTREMO ORIENTE (ATÉ SÉCULO XXI)

 

Vamos novamente ao MIAN (Museu Internacional de arte Naïf no Rio de Janeiro), lá podemos encontrar três obras em especial. A primeira recebe o título de Colheita de Frutas e Algodão feita por volta de 1975, por Fan Tche Houa, representando Huxian na China, a obra Dragão de J. W. Ghodhi do Sri Lanca e por último a obra trabalho no Campo pintada por um artista anônimo de Taiwan por volta de 1985. São três ricos exemplos de arte Naïf feita no extremo Oriente, mostrando que a arte Naïf não é produzida apenas no ocidente, em comum ela emana do povo, seus costumes, seu trabalho, as cores e formas do cotidiano e a pureza ingênua dos personagens.

A Pintura produzida na região da China, assim como sua arquitetura, vestimentas, comida e costumes vão influenciar outros países a sua volta, como o sudeste asiático e até algumas regiões do sul do Japão. A pintura que retrata a vida simples do trabalhador não é muito comum na China. Ao longo dos séculos sempre foi muito valorizado mostrar a vida da nobreza, com forte presença do vermelho, símbolo das conquistas de guerra e o dourado da riqueza, obtida por elas, é comum. Na porcelana os temas são de flores e de paisagens bucólicas, ou de dragões e leões.

Encontrei na minha pesquisa uma obra muito interessante que recebe o título de Rolo de Seda Pintado descoberto na gruta de Touen Houang no século III e hoje no Museu Cernishi de Paris. A obra representa um palarfeneiro com os seus cavalos de várias cores e cada cavalo está com cela. Ao todo temos 4 cavalos de cores variadas, e essa é uma das poucas pinturas onde vemos um trabalhador em cena do cotidiano. Geralmente a pintura era feita por membros da corte e podemos considerar a pintura chinesa, até o século XX, como uma pintura erudita, feita pela elite, retratando a elite e para a elite consumir.

No caso do Rolo de Seda Pintado está relacionado com a corte dos T’ang (618 a 907), corte que atraiu pintores de maior fama, que eram por sua vez poetas, eruditos, músicos e calígrafos, dedicados a disciplinas espirituais praticadas pelo escol. O rolo é considerado uma produção desse período, apesar de haver controvérsias e nem todos os especialistas concordarem com isso.

Outras obras me chamaram a atenção e nenhuma com nome do autor ou com indicação de período de execução. O destaque vai para a pintura dos templos budistas da região de divisa da China com a Índia, onde é retratada a vida simples de Buda e as pinturas decorativas das portas dos palácios, com temas de animais como o pavão e a garça.

Enzo Ferrara - Festa do ano Novo Lunar com vista da Cidade Proibida - Brasil - (2012)

Acervo Particular

No entanto no período pós 2ª Guerra mundial o povo da China teve maior contato com a pintura produzida no Ocidente e a partir daí passaram a produzir algumas obras na qual a vida do povo era retratada, como a rotina do trabalho  no campo e nas cidades, no qual tem um incrível poder de diálogo com a produção de pintura Naïf do Ocidente, agora podemos dizer que o Oriente Extremo também tem os seus naïfs.

As manifestações ou festas populares do oriente chegam a me inspirar, pois é isso que vemos na obra "Festa do Ano Novo Lunar com vista da Cidade Proibida. 

A INGENUIDADE NA ARTE DO JAPÃO (SÉCULO XVII AO XXI)

 

A nossa próxima parada é um museu, que tem um curioso acervo de arte da China e do Japão. Vamos visitar o Museu Nacional de Tóquio, que foi fundado em 1871, é até então, o maior museu do Japão, nele está guardada a coleção mais completa de arte japonesa do mundo, são aproximadamente 90.000 peças, que vão desde os tempos pré-histórico, até o começo da Era Moderna.

A primeira obra a ser vista  não é japonesa e sim chinesa e recebe o nome de Pescador solitário no Rio, feita por Ma Yuan, por volta de 1190 a 1224 d.C. A Obra em questão é uma pintura sobre seda, onde o horizonte desaparece e tudo se torna a superfície do rio, onde flutua um pequeno barco com o pescador solitário, misturando sonho com paisagem. Encontramos na obra a simplicidade e a pureza ao retratar o tema, que dialogam com a arte Naïf contemporânea. Os tradicionais barquinhos de pescadores com pequena cobertura são encontrados da mesma forma em locais do interior da china, onde se pesca da mesma forma ainda no século XXI. Na pintura ainda podemos ver um chapéu chinês sobre a pequena cobertura do barco e o pescador utilizando uma vara curta.

Kano Hideyori - Excursão a Takao - (Século XVI)

ORIGEM: https://www.tumblr.com/search/kano%20hideyori

A próxima pintura foi feita num Biombo de seis painéis em meados do século XVI, recebe o título de Excursão a Takao, de Kano Hideyori, e é do período Muromachi, a obra é tão importante que está entre os tesouros nacionais e nela podemos ver um grupo de pessoas, com trajes típicos daquela época, sentadas entre duas belas árvores, uma com folhas verdes, outra com várias flores avermelhadas, as pessoas são membros de uma mesma família de Takao, em visita a um templo em Kyoto, onde os jardins eram muito famosos, por ficarem coloridos na mudança de outono, costume que chega aos dias de hoje, quando muitos japoneses visitam jardins no período colorido, para tirar fotos mais bonitas e mais coloridas. Na pintura, podemos ver crianças que brincam correndo, jovens moças, alguns personagens já são de idade mais avançada e uma das figuras mais belas do biombo é uma mãe que está amamentando seu pequeno filho, o grupo parece ter parado para descansar e comer um pouco, o clima é de paz e harmonia, as pessoas se gostam, pois o artista conseguiu expressar o carinho que cada uma tem pela outra através do olhar, que é calmo e ao mesmo tempo ingênuo. Temos ainda, uma ponte arqueada e do lado esquerdo um grupo de guerreiros passeando, e um vendedor de doces e bebidas. A obra marca um período de ouro para a pintura de gênero da arte japonesa, com uma característica de pureza do tema que vem da realidade e a simplicidade das gravuras do século XVIII.

A segunda obra é uma pintura feita sobre papel em cores, num biombo de oito folhas, que recebe o título de Cena da Vida Campestre, do começo do século XVII, do período Momoyama (1586 a 1615 d. C.). A obra aborda uma cena da tradição japonesa, onde ilustra uma cerimônia anual do plantio do arroz que recebe o nome de Dengaku, ou Música dos Campos. As mulheres se curvam sobre o campo irrigado, os homens carregam nas costas os fardos de brotos que serão transplantados, alguns camponeses removem o barro e ervas com enxada ou arados puxados por bois. O principal da cena é o que está ao centro, carregadores de cestos e recipientes com alimentos e bebidas, assim como os músicos e mascarados que executam uma dança ritual, propiciatória de uma boa colheita. Celebrações ligadas à colheita é tema muito comum na produção de arte Naïf atual, porém no Ocidente é mais comum que tal celebração aconteça depois da colheita, como o que acontece durante a Festa do Divino Espírito Santo no Brasil, a Esfoliação do Milho em alguns vilarejos de Portugal. No Japão do outro lado do mundo, os costumes populares são diferentes. Quando visitei o MIAN no Rio de Janeiro, uma obra me chamou atenção, ela estava exposta na sala do acervo internacional, com o tema de mulheres colhendo arroz. A obra tem um dialogo incrível com o biombo, mostrando que o Japão, visto como país do futuro e da tecnologia, também é na sua essência, um país de cultura Naïf, talvez nem mesmo o próprio povo japonês saiba disso.

A arte da pintura no Japão era praticada pela elite, por pintores eruditos, para o consumo da elite, na forma de peças de luxo, com temas, cores douradas, e suportes que a nobreza elitizada valorizavam. Não era uma pintura para ser consumida pelos camponeses, pescadores e marinheiros, o máximo que eles poderiam fazer é ser tema das obras, mas isso estava prestes a mudar.

Hiroshige - A Cortesã - Japão (século XIX)

ORIGEM: https://www.wdl.org/pt/item/recent/2012/7/26/

Vincent van Gogh - A Cortesã - França (século XIX - Atualmente no Museu Vincent van Gogh - Holanda

ORIGEM: https://www.wdl.org/pt/item/recent/2012/7/26/

Enzo Ferrara - A lenda da raposa - Brasil (2008 - Atualmente em coleção particular

ORIGEM: imagem do acervo do artista

No caso do Japão a pintura teve que se renovar partindo de referências próprias, principalmente quando abriu suas fronteiras para o Ocidente. Com sua tecnologia, as tradições, costumes, e paisagens teriam que ser retratadas pela estamparia Japonesa, para reafirmar os seus valores culturais, numa realidade que mudava radicalmente dia após dia.

A Estamparia Japonesa sempre chamou minha atenção, pois vivo na cidade de Mogi das Cruzes, onde tem duas colônias que são muito importantes, a Árabe e a Japonesa, sendo a japonesa uma das maiores colônia fora do Japão. Por isso tenho livre acesso a produção cultural das duas colônias, principalmente na comida, e é muito comum encontrar a reprodução de antigas estamparias do Japão em cartazes, impressos, quadros e até em cortinas, mas é pelo colorido, pelo diálogo com os artistas e as cenas do cotidiano que me fizeram considerar algumas estamparias do Japão como arte Naïf. A importância da Estamparia Japonesa para evolução da história da arte é fundamental, pois foi através dela que os artistas impressionistas de Paris, tomaram consciência de que a luz do sol que brilhava no Japão, não revelava as mesmas cores que a luz do da França, sendo assim, um mesmo tema poderia variar de cores e até de formas dependendo da intensidade da luz aos olhos do artista.

A Estamparia japonesa é um processo de gravura em madeira que foi utilizado desde o século VIII por monges budistas nos textos sagrados, chamados de Sutra, e eram utilizadas para ilustrar a vida budista, e ilustrar os retratos dos mais ilustres pintores dos mosteiros.

Anônimo – Cena de caligrafia e vaidade – (provavelmente do século XVIII)

ORIGEM: https://www.loc.gov/exhibits/ukiyo-e/early.html

As Estamparias Profanas, que não retratam temas religiosos, e sim a vida comum, surgem no século XVII, ilustrando os primeiros livros Kanayoshi, que eram, na sua maioria, obras poéticas ou narrações lendárias. As primeiras estampas eram em preto e branco, conhecidas como estampas primitivas, ou Sumizuri – e, surgiram na era Manji (1658 – 1660), Logo os artistas viram todo o potencial que elas tinham, e não demorou para que fossem coloridas. O bom resultado final da Gravura Japonesa, tanto pelo grau de perfeição como pela beleza, é resultado da colaboração estreita de quatro pessoas: O pintor que idealiza o resultado final, o gravador, o impressor e o editor.

Durante o período que vai do século XVIII até o século XX, o Japão passou por profundas transformações, na política, na sociedade, na economia e na cultura, em um curto período de tempo deixou de ser um país feudal, passando por rápido processo de industrialização, até chegar aos dias de hoje que é uma potência tecnológica mundial.

Até o século XVIII a arte no Japão era produzida e consumida pela nobreza, mas as coisas estavam mudando, surgia uma burguesia ligada ao comércio, que se fortaleceu ainda mais com a abertura dos portos do Japão para o ocidente, promovendo várias trocas, entre elas a de produção das antigas estamparias, de colorido vibrante, que iria influenciar os artistas europeus.

Utagawa YOSHITORA, Trial Balloon Launch at the Naval Academy Training Ground at Tsukiji -  (1870)

ORIGEM: http://www.tokyojinja.com/tag/ukiyo-e/

A Primitiva estamparia japonesa, ainda em preto e branco, são as irmãs das Xilogravuras do nordeste brasileiro, pois tanto uma como outra tem a mesma finalidade de retratar acontecimentos da sociedade local onde elas são produzidas. Outros aspectos é que são bem populares, e são tão importantes, que continuam a ser produzidas até a atualidade. Surge então uma escola de Pintura chamada Ukiyo- e, que significa Pintura( E – Desenho/ Ukiyo –pintado), mas que se torna referência da “Busca do Agradável.” Os pintores representantes dessa escola eram atentos observadores do mundo onde viviam, pintaram a vida do povo com realismo, humor e ternura e rapidamente introduziram a inovação das paisagens na pintura, como novo sentido de verdade. Com essa inovação, o Japão retoma o ponto de partida para uma pintura onde a realidade nacional era valorizada, dando a burguesia da época um espelho onde se via refletida. A nova pintura valorizava tipos populares e a paisagem local, e foi desprezada pela nobreza, mas teve um forte reconhecimento entre o povo que ela retratava. Foi o primeiro momento de transformação da arte japonesa.

Hishikawa Moronobu - Representação em barco - (Século XVII)

ORIGEM: http://gepeskonyv.btk.elte.hu/adatok/Okor-kelet/Okori.es.keleti.muveszet/index.asp_id=391.html

O primeiro artista a ser falado foi o pioneiro da escola Ukio – e, conhecido como Hishikawa Moronobu (1615 a 1694), ele pintou as cenas de personagens retratando a vida no Japão e começou a introduzir as cores. Um belo exemplo da obra de Moronobu é a obra Imagem do mundo efêmero, que está no Museu Guimet, de Paris. O artista trabalhou uma cena de interior, onde vemos personagens com um aspecto ingênuo, das gueixas com seus quimonos coloridos e ricamente adornados por desenhos populares das vestimentas das artistas, que estão praticando a caligrafia, praticando dança e o cuidado da beleza. Moronobu retratou como ninguém o bairro dos prazeres, o célebre Yoshiwara de Tóquio, desde os balneário até os prostíbulos, com todas as pequenas intrigas daqueles meios boêmios. Outros artistas devem ser falados como Torii Kiyonobu I (1664 a 1729), Torii Kiyoshige (1730 a 1760) e Okumura Masanobu (1686 a 1764).

Torii Kiyonobu I

ORIGEM: http://www.1st-art -gallery.com/thumbnail/91528/1/Indoor-Games-1751-64.jpg

Avançando um pouco mais a diante, no século XIX a estamparia japonesa irá receber influência da pintura do Ocidente, ficando mais colorida, utilizando os recursos da busca pelo horizonte, e fazendo a utilização da caligrafia, considerada no oriente como uma arte a parte. Em algumas obras os personagens quase desaparecem, como no caso da gravura japonesa mais famosa até o momento. Seu título é A Vaga/ Fuji sob a tempestade, que esta também no Museu Guimet. É a obra que melhor corresponde à sensibilidade do autor Katsushika Hokusai (1760 a 1849) e nela podemos ver um grupo de pescadores em três barcos, em meio a um mar furioso de ondas azuis com espuma, ao fundo o Monte Fuji, montanha sagrada que reflete toda a poesia do povo japonês e de seus artistas.

Katsushika Hokusai - A Vaga/ Fuji sob a tempestade

Origem: https://aidobonsai.com/page/44/

A busca por valorizar o popular, a identidade nacional do Japão, a busca pelas cores e formas, a utilização da escrita são pontos que unem a arte japonesa com a pintura Naïf contemporânea, chegando até a influenciar alguns artistas, como é o meu caso, pois já pintei a obra A lenda da Raposa, em 2008, em comemoração ao centenário da imigração japonesa no Brasil e a obra O Saci, a Gueixa, o Monstro de Fukushima e o gato de Três olhos em 2012. São dois bons exemplos, que recebo a influência de uma cultura que considero como cultura adotiva, pois tenho o maior carinho pela colônia japonesa e isso se expressa na minha produção.

Enzo Ferrara - O Saci, a Gueixa, o Monstro de Fukushima e o gato de três olhos - Brasil - (2012)

Agora, vamos retornar para a Europa e ver como surgiu o termo Naïf, na cidade de Paris da segunda metade do século XIX. Não é por acaso que voltamos do tema do Japão para a introdução na pintura de Paris, afinal os artistas do Japão influenciaram de muitas formas os artistas franceses.

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