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W. Hogarth - Angariadores de votos nas Eleições de 1754 

A PINTURA DE COMUNICAÇÃO VISUAL (Século XVIII)

 

Sabemos que a produção artística não fica restrita exclusivamente aos ambientes das classes abastadas e nobres, e no decorrer da história isso fica bem claro. Neste texto iremos falar dos chamados pintores amadores de placas. As placas de comércio, ou para propaganda em geral, em séculos anteriores ao XXI, não eram muito valorizadas, pois eram feitas em madeira e colocadas ao relento, sob sol e chuva, condenadas a desaparecer com o passar do tempo, por isso eram feitas por pintores amadores e de gosto popular, é o que vemos na obra Angariadores de votos nas Eleições de 1754, do artista inglês W. Hogarth, que está no Soane Museum de Londres (parte superior da página). Devemos analisar a obra com um outro olhar, voltado não para a cena que está acontecendo em primeiro plano, mas sim para as placas penduradas numa armação de madeira, que lembram uma forca. Observamos nela uma cena de gosto popular onde um dos candidatos empurra um carrinho de mão e joga moedas de ouro para o povo, na segunda placa vemos o exército inglês na rua, já na época símbolo de segurança e ao fundo uma coroa dourada, simbolizando a distância da realeza em relação ao povo. A maioria desses artistas amadores são anônimos, mas a produção teve uma importante contribuição para a evolução das artes plásticas como um todo, e aqui devem ser visto como pintores Naïfs, comparados aos primitivos dos Estados Unidos e pintores das tábuas votivas na América Latina da mesma época.

Outro tipo de placa encontrada pela pesquisa foi a de Cerâmica de Faiança. A característica principal da cerâmica de Faiança é a vidrificação estanhada, que já aparece num jarro de (1365 d.C.), mas o modelo encontrado foi uma placa do século XVIII, feita pelos fornos dos Condes Ferniani, destinada provavelmente a uma taberna, onde podemos ver uma cena muito simples de um homem e uma mulher sentados em volta de uma mesa redonda fazendo um brinde. A técnica do contorno dos personagens, o antinaturalismo da toalha da mesa, o colorido dos personagens, a cena tirada do cotidiano tornam a placa uma legítima obra de arte Naïf.

Os pintores de placas são tão importantes para a pintura Naïf do Leste Europeu, quanto à pintura de Ex-voto é para a América Latina. Em finais do século XIX, os melhores pintores de placas de letreiros colocam seus nomes em algumas encomendas, assim um ou outro chegou aos dias de hoje, alguns com notável talento artístico.

Na virada do século XIX para o XX em São Petersburgo, cidade da Rússia, vê surgir um nome de um artista notável, é o caso de Konstantin Grushin. Nos seus trabalhos para as lojas da cidade se destacam pelas magníficas Naturezas Mortas de frutas e legumes, e belas paisagens com bois e pássaros. O artista costumava pintar as placas com uma margem negra. Já o pintor Yevfimiy Ivanov, conseguia produzir obras que realmente merecem destaque, seu estilo era livre e aberto. Mesmo tendo que escrever letras na obra, cada artista teve que se adaptar a seu modo, não se limitando a produzir obras corriqueiras da representação, mas passando uma mensagem de uma forma criativa e de muitas formas inovadoras.

Um bom exemplo é um anuncio de fornecimento de mobília pintado pelo talentoso Konstantin Filippov. Pode ser chamado de letreiro apenas por que tem letras, por outro lado pode ser considerada uma pintura de cavalete, pela sua beleza e criatividade. Cavalos de tração num retrato cheio de força, e foram colocados contra um plano de fundo de delicadas pinceladas, as rodas e os arreios dos cavalos foram minuciosamente pintados. Este trabalho é típico dos artistas Naïfs Urbanos, tendo como base de comparação a famosa La Carriole du Père Juliet (Carroça do Padre Juliet), de Henri Rousseau, pintada em 1908.

As lojas de roupas prontas para vestir eram particularmente privilegiadas pela qualidade dos seus letreiros. Os letreiros de Vasily Stepanov para as lojas de um certo Sr. Kuzmin apresentavam damas e cavalheiros vestidos à moda. O artista executou a obra como recebeu encomenda para pintar um retrato de cerimônia, virtualmente em estilo de salão.

Os letreiros da região da Rússia eram singulares, embora típicos do gênero, eram altamente representativos tanto da sua época como do local onde foram executados e encomendados, como tal, constituem uma espécie de documento histórico. Não é de surpreender que letreiros como aqueles fossem tão apreciados pelos artistas de vanguarda da Rússia, da mesma geração de Picasso, que muitos desses artistas colecionaram as pinturas de letreiros.

Niko Pirosmani - Letreiro para uma Taberna

Algumas placas conseguiram chegar aos nossos dias, é o caso do Letreiro para uma Taberna, Pintado pelo talentoso artista Niko Pirosmani, com uma técnica inovadora com tinta óleo sobre folha de estanho, nela podemos ver o transporte de um boi inteiro, que foi abatido e está sendo transportado por carro puxado por dois bois até o restaurante, que é uma casinha na beira da estrada, o carro é seguido pela figura de um homem, com trajes típicos, talvez o dono da taberna que encomendou a obra. A obra é tão importante que faz parte do acervo do Museu Georgiano de Belas Artes em Tbilisi, capital da Geórgia.

Em 2008 a empresa brasileira de fertilizantes Bunge escolhe uma vista de uma fazenda, feita com a estética Naïf para representar a comunicação visual em sites, propagandas e em revistas, como a revista Veja, onde eu colhi a informação, mostrando que ainda hoje a arte Naïf pode ser utilizada como forte meio de comunicação.

Podemos ver na propaganda uma fazenda com produção diversificada onde, ao lado de uma plantação de girassol, mulheres colhem laranjas, vacas brancas pastam numa grama verde, pequenos tratadores alimentam uma criação de porquinhos coloridos, vários agricultores, usando chapéus, colhem café na plantação. Uma colheitadeira vermelha colhe o trigo amarelo, ao fundo vemos uma grande horta sendo regada por dois personagens. Ainda existe uma plantação de bambu e pequenos núcleos de casinhas coloridas com montanhas azuladas ao fundo, onde a cena é cortada por uma pequena estradinha, por onde passam um carro de boi, um homem carregando um saco e um pequeno caminhão carrega a carga de maçãs vermelhas, por último vemos um pequeno depósito com dois caminhões de carga, prontos para levar a produção rumo a cidade grande, a propaganda é uma verdadeira obra de arte que representa a identidade visual e cultural agrícola do povo brasileiro. Infelizmente não encontrei o nome do autor, que aqui ficara como anônimo.

A Arte Naïf na comunicação visual não ficou no passado. Ela acompanhou o desenvolvimento da sociedade e novas formas de ser utilizada, em 16 de setembro de 2012, estive na cidade de Embu das Artes, nos arredores de São Paulo. Essa bela cidade está intimamente relacionada com a arte Naïf no Brasil e lá encontrei muitas coisas. Embu das Artes, a meu ver, transborda cultura por todos os lados, com lojas que vendem de tudo, do artesanato à antiguidades. Existem algumas galerias e para minha surpresa a arte estava presente numa placa. A loja A Baronesa, tem como placa uma mulher com trajes de época, segurando um leque, e que foi pintada a mão numa tábua um pouco desgastada, pois a placa fica de baixo de sol e chuva. Essa placa é prova viva de que a mesma placa, feita da mesma forma técnica, há séculos atrás, continua servindo até hoje para comunicar através do olhar.

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