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IMAGEM: VISITA AO ATELIÊ DO PINTÔR RAFAEL E OBRAS DO MESMO ARTISTA REALIZADAS E PUBLICADAS PELA REVISTA

O CRUZEIRO 21 DE FEVEREIRO DE 1953.

ORIGEM: ARQUIVO DO ACERVO SEM PAREDE

BIOGRAFIAS DE ARTISTAS NAÏFS DO BRASIL 01

 

A decisão de colocar a biografia de alguns artistas naïfs aconteceu ao decorrer da pesquisa, pois somente através do estudo sobre a vida de cada um deles é que o leitor entenderá a verdadeira importância de cada um na história das artes brasileiras, quantas histórias de luta, de sacrifício e dedicação, que contribuíram, e muito, para a nossa reafirmação cultural, pois antes de valorizar, tanto no sentido econômico, quanto no cultural, é necessário conhecer para aí sim valorizar e proteger. Quem sabe despertar nas futuras gerações o sentimento de que cada artista colocado nesse livro contribuiu para a construção da identidade visual do povo brasileiro. Em cada biografia que selecionei para o livro, parece um espelho em que vejo a milha própria biografia refletida na história de muitos deles, fazendo um elo de ligação entre todos os artistas naïfs brasileiros.

As biografias são resumidas e nem todos os artistas naïfs estão aqui, primeiro por falta de materiais e publicações que falem sobre o assunto em bibliotecas e segundo pelo fato de que eu tenho o projeto de fazer, futuramente, biografias mais detalhadas e amplas de cada artista pesquisado, ou seja, o leitor deve ver cada biografia apenas como um aperitivo.

O diferencial das biografias escritas e publicadas pelos “especialistas” e as que estão neste livro, é a seleção do grupo de um período amplo e sob um olhar de artista naïf semelhante a eles. Foram selecionados os artistas que mais contribuíram para a construção da história da arte naïf, tendo como principal foco os pintores brasileiros, e as bases de seleção foram o momento histórico em que viviam a qualidade das obras, os temas universais e os que melhor retratavam o povo, em suas cores e costumes. Não é objetivo cobrir inteiramente todos os artistas naïfs que já existiram, mas sim falar daqueles que se destacaram mais dentro do projeto de base desse livro.

 

Pintôr Rafael (19?? – 1???)

 

Pesquisar é descobrir um mundo novo, as vezes desconhecido, foi a conclusão que cheguei ao encontrar um artista, classificado como primitivo, que deu uma entrevista para a revista O Cruzeiro, publicada em 21 de fevereiro de 1953. Temos poucas informações sobre ele, uma delas é o nome do artista: Pintôr Rafael, esse era seu nome artístico. Por ser muito difícil conseguir essa matéria eu vou colocar na integra logo a seguir:

O título da matéria é 'O mundo mágico de Rafael' e como destaque falava que ele expõe no Museu de Arte Moderna de São Paulo (com grade sucesso) as figuras da mitologia ioruba. O maior pintor primitivo em terras do Brasil. Pinta somente aos sábados e domingos e, às vezes, à noite. Tendo como base o texto de Odorico Tavares e fotos de José Medeiros.

“Há dois anos passados, revelamos em reportagem nesta revista um novo pintor primitivo brasileiro: Rafael, pai de santo na Bahia, carpinteiro, marinheiro, agente da polícia, senhor absoluto de seu terreiro, no Alto do Pinô, nas proximidades da praia de Ondina, na capital bahiana. Sem jamais se preocupar de ser realmente um pintor, ia realizando os seus quadros, todos eles mostrando figuras da mitologia ioruba, divindades do Flos cantorum africano. Eram todos eles para decorar seu terreiro: Oxosse na Caça, Iemanjá dominando suas águas, Exu nas suas diabruras pelas encruzilhadas, ou o Candomblé em Função, eram as telas que Rafael trabalhava para enfeitar a sua casa.

O repórter, em sua primeira visita, ficou deslumbrado: estava em frente de um pintor autêntico, um pintor sem erudição é certo, mas cheio de uma graça, uma frescura, uma originalidade não somente na poesia que dele emanava, mas sobre tudo no seu sentido forte de composição, nas suas cores, nos valores plásticos que criou inconscientemente representavam.

Não iria decepcionar Rafael. A repercussão que suas telas viriam a ter não alterava o homem simples e bem educado que é. Continuou suas funções: não deixou seu lugar na polícia, não deixou de bater seu candomblé, o seu “Terreiro” continua aberto, não pôs de lado seus instrumentos de carpintaria. E continuou pintando: aos sábados, aos domingos e quando o cansaço da jornada permite, também à noite. Uma exposição que fez na galeria Oxumaré, foi um sucesso: vendeu todos os quadros, não somente para colecionadores locais, mas sobretudo para turistas ou viajantes. Turistas ou viajantes estrangeiros, encantados com a beleza e o exotismo de sua pintura. Dois anos que se passaram, pois, deram a Rafael um lugar privilegiado na pintura brasileira. Hoje, ele é incontestavelmente o maior pintor primitivo que possuímos, pois sua pintura sempre se renova, sempre se enriquece, graças a disciplina, e ao talento que possui. Seus últimos quadros e em número superior a cinquenta, foram exposto no Museu de Arte Moderna de São Paulo e os sulistas tiveram oportunidade de conhecer melhor sua obra. Viram que não é só apenas o primitivismo, que existe em suas telas, o que interessa: a coisa pitoresca, a pintura de um pai de santo da Bahia, coisa acidental ou transitória, existe uma força, um sopro forte de poesia, que emana sobretudo do domínio de sua arte. Existe no seu colorido, como de poucos pintores nacionais, eruditos ou não. As suas florestas não são apenas verdes, ou tons variados de verdes. O mundo vegetal que ele sente e que nos transmite é uma festa de cores, e cores soberbamente trabalhadas! A sua floresta é um mundo que recebeu a visita transmutadora do arco – íris. As suas estradas, suas árvores, seus animais, seus rios são composições de uma largueza, de uma segurança, de um grande domínio, que nenhum outro pintor primitivo brasileiro conheceu. O mundo mágico que vive com o Pintôr Rafael, o mundo mágico de seus Santos Africanos, o mundo de seu terreiro, este mesmo mundo está todo na obra plástica do pintor, como as obras mais belas e mais autênticas, que a pintura brasileira já conheceu.

Há quem muito desdenhe ao nos ver falando assim. Há os que somente admitem a pintura aprendida nos “ateliers,” com os mestres, com as influências, pois pintura não é coisa que se improvise e que nasça do céu, como um passe de mágica. Há os que sabem os poucos minutos que duram os pintores primitivos, nascendo e desaparecendo de um dia para outro. Os pintores engraçados apenas, de quem se compra uma ou outra tela, por esnobismo, mas que nunca se colocaria numa sala elegante. Estamos certos que a pintura de Rafael sobreviverá a esses dias de primeira impressão do gracioso e do diferente. Analisando seus quadros de dois anos passados e os de hoje: há uma ascensão e uma ascensão dentro do critério de pintura o mais rígido. O pintor se enriquece extraordinariamente, sem que deixe de ser, nem por um minuto, o Pintôr Rafael, que o Museu de Arte Moderna de São Paulo expôs ainda no mês passado. Elas exprimem o que a terra nacional tem de mais puro e autêntico. Nos pincéis do prêto Rafael, que se comunica com os seus deuses, os deuses africanos de seus antepassados, através de seu “Terreiro” e de sua arte, há o frescor da terra, a graça do povo negro da Bahia, a beleza da gente, das árvores e dos bichos, vistos através de um autêntico e puro artista que saiu deste povo para expressar este mesmo povo de uma maneira ingênua sempre, mas poderosamente autêntica, embora um tanto fantástica. O que é mais uma maneira de afirmar como autêntico e como pintor. Ao ver as obras de Rafael, salta os olhos de qualquer pessoa, e sem dúvida é um pintor Naïf, as fotos são coloridas, as matas, o gramado, as águas, as ricas vestimentas dos personagens, que são pequenas figuras, em meio a grandes espaços, onde se desenrola os acontecimentos. Eu em particular não conhecia o artista até esse momento”.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

IMAGEM: DJANIRA PINTANDO EM SEU ATEILÊ EM SANTA TERESA, RIO DE JANEIRO (DÉCADA DE 1970)

 

Djanira Motta e Silva (1914 - 1979)

 

A artista plástica Djanira é sem dúvida a que mais teve sucesso no panorama nacional, na pesquisa foi a artista que eu mais encontrei material biográfico, com muitas fotos das obras e da própria artista, tive a dificuldade de selecionar um material inédito, foi aí que encontrei uma entrevista feita nos anos de 1960, e que colocarei no livro logo a seguir. Djanira não gostava de ser chamada de Primitiva ou de Naïf, ela se considerava uma artista moderna e contemporânea, mas sua produção não se encaixa em nenhum outro estilo a não ser o de produção de arte Naïf nacional.

Em 26 de setembro de 2011, quando limpava e catalogava algumas revistas antigas encontrei uma entrevista que a artista plástica Djanira deu para a revista O Cruzeiro e publicada em 21 de julho de 1962. Tive que redigir e deixar a entrevista mais contemporânea. Com base no texto de Quirino Campofiorito e fotos de Antônio Rudge e Jean Solari, são fotos raras e inéditas da artista em seu ateliê no bairro de Santa Teresa na cidade do Rio de Janeiro, onde viveu por muitos anos e que traz uma informação que eu até então não sabia, uma foto de Djanira em seu refúgio, uma casinha na cidade de Parati, no litoral Fluminense. As fotos mostram a artista em sua casa a acariciar um cachorro deitado ao chão, pois a artista gostava muito de animais, revela um retrato íntimo da artista, deitada numa rede, cercada de imagens sacras, de suas obras de arte, de livros, esculturas, numa casa confortável, um ateliê, classificado pelo repórter, como Ateliê Erudito. São oito páginas de entrevista com a artista, com bastante fotos.

O título da matéria é NO MUNDO MARAVILHOSO DE DJANIRA.

 

“Procuro valerme dos valores eternos, os mais positivos que o ser humano traz com sigo, a alegria, o puro prazer de ver o que a energia e a inteligência podem criar para o benefício geral. Jamais poderei encontrar beleza na caricatura do ódio ou num falso amor.”

 

“Quem poderia falar assim, senão Djanira, uma criatura dotada de ternura sem limite para todas as coisas do mundo, que seriam todas boas se lhes assistisse sempre aquela mesma ternura? Quem poderia pensar assim, desejar assim, conceber um mundo assim, propor uma existência assim, e assim tornasse, ela própria, exemplo humano?

Aquelas palavras de Djanira, nós ouvimos e todo o mundo pode ouvir se escutar o que lhe diz a pintora, seja pelo idioma, de sua arte, que fica, misteriosamente gravada em suas telas ou em seus desenhos; seja pelo seu falar singelo, desprevenido, impulsivo até de tão singelo e desprevenido, voz cadenciada, como se deixasse passar pela trama mais fina da sensibilidade, as palavras vagarosamente; é o seu jeito, palavra por palavra, palavras que trazem, como as suas pinturas e os seus desenhos, as cores ternas e harmoniosas, as formas despojadas de detalhes supérfluos, as linhas vibrando ao registro de emoções incontidas e fluentes. Fazer uma visita ao ateliê de Djanira é como empreender uma aventura até um mundo maravilhoso. Não há, em realidade, limitações para a satisfação do espírito naquele ambiente para que seja apenas um recanto e deixe de ser um mundo mesmo. Há ali a amplitude real de um mundo de humanidade e de beleza, que se condensa naquele espaço e se desdobra em cada minuto que ali permanecemos, em espaços maiores, cada vez maiores, até que nossas satisfações, de encantamento em encantamento, vão sendo infinitamente correspondidas em cada tela, e são muitas telas e muitos espaços do mundo nelas contidos; em cada desenho que a artista destaca de uma pasta repleta de registros instantâneos, que são igualmente numerosos pedaços deste mundo grande que Djanira vive, com ele se move, um mundo de ternura permanente, em que as criaturas humanas e as coisas constituem finalidade à existência, desdobram em tempos e espaços permanentes, eternos, a vida que convida à vida. Sobre a pintura a matéria falava que giravam em torno de temas humanos, cenas populares e folclore são os motivos que Djanira procura em constantes peregrinações pelo Brasil.”

O mundo Maravilhoso de Djanira tem dois pólos de atração: O ateliê erudito de Santa Teresa e a simplicidade rústica das velhas ruas coloniais de Parati. A residência de Djanira é lá nos altos de Santa Teresa. Ali mesmo está o seu ateliê. Para chegar lá não basta o bondezinho elétrico que parece subir a montanha cabriteando e pinoteando sobre cada emenda de trilho a trilho. É necessário usar também uma condução funicular, que dá acesso final a um inacreditável pitoresco lugarejo.

Não será sem alguma razão que a artista plástica foi morar na montanha, e relembremos que Djanira começou para a arte quando morava em Santa Teresa, ou seja, foi reconhecida como a grande artista plástica que é. A montanha tem lá seus mistérios. É de uma remota lenda chinesa que a montanha possui uma vida interior importante para as seduções humanas. A lenda lhe destina evocações particularíssimas. A montanha será a própria personificação da humanidade, numa concepção cósmica e mística. A montanha é uma coisa viva em cujas veias corre a água que é o seu sangue, e que se transforma em nuvem, por transpiração. Foi sempre diante da natureza, que o pintor chinês, como aliás todos os orientais, se apegavam a julgamentos que envolvem o sentido poético e humano em suas obras. A criação artística não devia ser um modesto registro da sensibilidade individual, condensação apenas preocupações pessoais, ao contrário, havia de possuir uma condição universal dos sentimentos humanos. Tudo isso veio nos a lembrança enquanto éramos levados e elevados ao mundo de Djanira, no alto da montanha pitoresca que é Santa Teresa, montanha de mil casas que parecem apenas encostadas nas pedras e sustentadas pela vegetação.

Peças de mobiliário colonial, santos barrocos fazem moldura permanente que se movimenta Djanira, com sua vida de artista e de dona de casa, essa mulher de cabelos pretos e corridos, herança de suas raízes indígenas, como disse um jornalista, essa mulher de ar espantado e coração puro‟, Agora nas palavras de Jorge Amado. Os quadros que vemos são muitos. Todos para sua exposição em Madri e em seguida em outras capitais na Europa, que Alfredo Bonino promoverá.

A Obra de Djanira é uma janela aberta para o Brasil traduzindo com profundidade emocional em obras de arte, toda a identidade cultural do povo brasileiro. O lado complicado dos pensamentos artísticos tão de gosto da critica de hoje em dia, e não menos preferidos pelos filósofos da estética, não pode figurar ao lado da obra de Djanira. Diante de suas telas serão impossíveis conjunturas esteticistas que lhe perturbem a espontaneidade de concepção e realização.  Sua pintura não oferece oportunidade para isso. A sua aberta autenticidade e a exatidão de simplicidade e clareza de inspiração, sugerem ideias igualmente simples e claras na sua apreciação. Sim, porque Djanira não quer saber de “ismos”, mas apenas pintura, como a maioria dos artistas naïfs. A artista disse certa vez que: “Tema e Forma são elementos indissolúveis e se equivalem em importância”. Ai esta uma definição que dada pela própria pintora à sua obra, que por isso só é o roteiro de quanto se queria indicar de permanente e apreciável em sua criação. Toda a divergência critica diante desta proposição tão dogmática de Djanira para as condições essenciais de sua obra, afasta o critico da presença de suas telas. “Os temas humanos, o folclore, as cenas populares, são aqueles que me seduzem”, o amor aos seres e as coisas, o caminho do sacrifício, do amor é beleza e fé constante na humanidade.

Djanira, com suas palavras singelas, mas sempre expressando um fundamento humano de sôfrega solidariedade, terá levado o critico Carlos Flexa Ribeiro a escrever que nossa pintora, “numa época de tantas e tão rutilantes tenções estéticas tem sabido se manter insubordinávelmente fiel a si mesma”. Djanira teve sempre o mundo como modelo e o tempo como mestre, desde seus primeiros instantes de pintora, quando logo se pode se desvencilhar das mãos que lhe apoiaram os passos incipientes na arte que viria a dominar como uma personalidade que sempre mais se afirma e se confirma. Errado será dizer: para ficar bem com a moda, a moda de certas expressões, que não existe nada de anedótico, episódico ou acidental nas composições de Djanira. Será desconhecer a medida da força criadora da pintora que se firma muito sobre aqueles fatores, para constituir e personalizar a significação plástica e as comunicações estéticas que se confirmam e se condensam não apenas para efeito de interpretação dos temas, mas para a permanência de rigorosa criação artística.

A pintura de Djanira é sobremodo comunicativa, agradável, atraente e repele qualquer hermetismo que pudesse lhe roubar a comunicação decidida e integral. Curioso verificar que em sua obra não encontramos atitudes propositadamente antiacadêmica e muito menos acadêmicas. Antiacadêmicas não, porque isso significa seguir o caminho de um outro academismo; acadêmicas menos ainda, porque Djanira, não olha apenas modelos, mas sente e sofre dramas humanos. Contra as duas atitudes formalistas, ela permanece voltada para si mesma, procurando ver o mundo pela sinceridade dos sentimentos que espelham a vida, e não se perdem fora do mundo. Sua técnica prescinde dos recursos exorbitantes de modelado em claro e escuro que se destinam a imitar o relevo, porém falseiam os valores essenciais pictóricos que prescidem de uma pseudoprofundidade de espaço sobre o plano.

Os detalhes, mesmo os mais anedóticos, se traduzem plasticamente por uma verídica e direta, que não pensa em mistificar realidades táteis, mas sim sugerir sensações ópticas que, através de recursos rigorosamente significativos pictoricamente, vão dramatizar melhor a realidade emotiva. Não procura também Djanira se valer de uma enfática retórica modernista, em que problemas de técnica deverão se desincumbir da expressão integral do quadro, por afetação dos recursos da matéria pictórica e da improvisação pelo emprego exorbitante de materiais estranhos às conclusões que normalmente cabem no objetivo as pintura.

Seu interesse pela vida popular, por tudo que marca a existência na sua simplicidade de origem a têm levado a conhecer o Brasil até os recantos mais longínquos, variados e originais. Chegou mesmo a demorados contatos com indígenas de tribos que habitam regiões inóspitas. As primeiras andanças de Djanira no interior do país foram em São Paulo, Paraná, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Depois Bahia e Maranhão, e, por fim os silvícolas de Goiás e Mato Grosso. Sua obra vem se fazendo cada vez mais o retrato do Brasil, de sua gente, de seus costumes mais autênticos. Em Parati, a velha e esquecida cidade colonial do litoral Fluminense, Djanira tem expandido a sua ternura pelas belas reminiscências que ali ainda se conservam não se sabe como.

A paisagem, os motivos urbanos das antigas vilas, as personagens que parecem viver um mundo que deixou de existir, os rituais afro brasileiros e indígenas, o camponês e o trabalhador das cidades, vão sendo, pela nossa brava pintora, traduzidos com profundidade emocional para obras de arte que já identificam um trabalho original na sua cultura brasileira. A Obra de Djanira é uma janela aberta para o Brasil e um largo gesto de ternura por tudo quanto viram os olhos da pintora e por tudo quanto palpitou o seu coração imensamente generoso e simples.

 

O Cruzeiro, 21-7-1962

 

Ela nasceu em Avaré, interior do estado de São Paulo, mas sempre viajou e conheceu o Brasil de ponta a ponta. A vida de Djanira nem sempre foi tranquila, ainda na infância é criada pelos avós na cidade de Porto União no Estado Santa Catarina, depois da separação dos pais. Na cidade é testemunha da passagem da Coluna Prestes, um Movimento Político Militar de origem Tenentistas liderado por Carlos Prestes, que entre 1924 a 1927, percorreu o interior pregando formas políticas e sociais, era de forte oposição ao Governo de Getúlio Vargas. Um tio de Djanira participava como revolucionário e quando as tropas do governo estiveram na cidade perseguindo líderes, ele foi obrigado a se esconder no sótão do cinema, por longo período, onde as tropas do governo escutavam música. A jovem Djanira, corajosamente levava comida escondida na boneca para alimentar  seu tio. Ela ficou na cidade trabalhando na lavoura até 1928, quando retorna a Avaré, onde também trabalhou na lavoura de café, essa vivência no trabalho agrícola e no cotidiano do campo, com suas festas populares, futuramente viram temas de futuras pinturas.

Quando completou 18 anos foi morar na cidade de São Paulo num quarto pobre de pensão na região da Avenida São João. Trabalha em São Paulo como doméstica, limpadora de máquinas e vendedora ambulante, logo o trabalho pesado cobrou seu preço e ela ficava doente com frequência. Em 1932, acontece a Revolução Constitucionalista e o estado de São Paulo entra em coflito com o Governo Federal, na época no Rio de Janeiro, para ajudar as tropas a artista costura camisas para os soldados. Nesse período, numa viagem a cidade de Santos ela conhece o Marinheiro Bartolomeu Gomes Pereira. Os dois se casam, ela logo engravida, mas perde o filho e descobre que não pode gerar filhos devido ao mau desenvolvimento do útero. Ela fica abalada e doente. Em 1937, é vítima de tuberculose pulmonar e é internada em São José dos Campos, seu caso é grave, ela passa o tempo fazendo rabiscos, é seu primeiro processo artístico, ela faz o esbolço de cristo na cruz, se recupera e vê nisso um milagre.

Curada, é aconselhada a se mudar para um local mais quente. Em 1939, ela muda para a cidade do Rio de Janeiro onde compra uma casa no morro e trabalha como costureira, logo consegue comprar o sobrado em Santa Teresa e trabalha como dona de pensão, conhece o artista Romeno Emeric Marcier, que foi o primeiro a lhe dar noções de arte. Ela frequenta o curso de artes e ofícios e durante seis meses aprende, porém ela já era uma artista e não vê muito sentido em continuar no curso.

Durante a segunda Guerra Mundial, perde o marido que estava trabalhando como marinheiro num navio torpedeado por um submarino alemão.

O ano de 1942 marca o nascimento de Djanira para o mundo das artes, ela logo expõe ao lado de grandes artistas e fica intusiasmada com o rápido sucesso. Consegue vender algumas obras a valores significativos e viaja com poucos recursos e sem falar inglês para os Estados Unidos da América, onde é ajudada por uma apoiadora. Retorna ao Brasil onde continua viajando para pesquisar e produzindo ativamente, em especial vai para o Estado da Bahia, onde estava acontecendo atividades ligadas ao Salão de Arte Contemporânea de Salvador, lá ela conhece Jorge Amado e os temas dos Orixás.

A década de 1950 é marcado pelo intenso trabalho de produção da artista, que retrata em suas obras todo tipo de tema como os trabalhadores no campo, o circo, os vendedores ambulantes na praia de Copa Cabana, os temas ligados a cultura Afrobrasileira, as encomendas e em especial os temas indígenas. Durante o final da década de 1950 ela conhece várias tribos indígenas, como a dos índios Canelas, é um reencontro etnocultural com as raízes da artista, pois ela era de origem indígena por parte de pai e austríaca por parte de mãe, um exemplo belo da misigenação brasileira.

Em 1963, a artista recebe o convite do Governador do extinto Estado da Guanabara, Carlos Lacerda, para produzir um grande painel de cerâmica no túnel Santa Barbara, hoje remontado no pátio interno do Museu Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro, foi considerado por muitos como o ponto alto da pintura Cerâmica no Brasil, e aborda o tema religioso onde a artista retratou a imagem de Santa Bárbara.

Em 1964, já no período do Golpe Militar, fica detida por algumas horas pela polícia política do Regime Militar, sob acusação de estar ligada a atividades subversivas. Quando foi liberada a artista protestou e se dedicou ainda mais ao trabalho, viajando e produzindo. Produz serigrafia e começa a fazer ilustrações. Djanira sempre teve problemas cardíacos, durante o final da décade de 1960 e toda a década de 1970, fica mais reclusa no seu ateliê em Santa Teresa.

Em 1964, já no período do Golpe Militar, fica detida por algumas horas pela polícia política do Regime Militar, sob acusação de estar ligada a atividades subversivas. Quando foi liberada a artista protestou e se dedicou ainda mais ao trabalho, viajando e produzindo. Produz serigrafia e começa a fazer ilustrações. Djanira sempre teve problemas cardíacos, durante o final da décade de 1960 e toda a década de 1970, fica mais reclusa no seu ateliê em Santa Teresa.

Em abril de 1979, depois de ter sofrido dois infartes e ainda se recuperando ela produz dois Trípticos, três pinturas unidas pelas molduras, com tema da Baía de Guanabara, são suas últimas obras.

Djanira falece no dia 31 de maio de 1979, vítima de um infarto.

A obra de Djanira é única, ela nos deixou como legado uma grande produção, suas obras estão conservadas nos acervos de grandes museus Brasileiros e até no exterior, como o acervo do Museu do Vaticano.

Atualmente a Sala do Gabinete da Presidente Dilma Roussef, que foi a primeira mulher eleita como Presidente na história do Brasil, é decorada com um grande painel de Djanira, aliás muitos prédios públicos na cidade de Brasília tem obras de Djanira, muitas são expostas em ocasiões especiais.

Os Palácios do Governo dos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro tem em seus acervos obras de Djanira e a coleção da Caixa Econômica Federal começou com a aquisição das obras da artista, ainda na década de 1940, hoje ilustram, as vezes, os bilhetes de loteria da Caixa.

Djanira nos mostrou que é possível ter o valor cultural do seu trabalho reconhecido, foi uma das primeiras mulheres a conquistar sucesso e prosperidade com o seu trabalho, tendo uma qualidade plástica de igual desenvolvimento e valor ao trabalhos produzidos por artistas masculinos. Djanira é um orgulho para a história das artes visuais brasileira.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

ATRIBUÍDO A CARDISINHO/ BARCOS NA BAÍA DE GUANABARA.

ORIGEM: http://artenaifrio.blogspot.com.br/2012/06/cardosinho.html

 

Velho Cardosinho (1861 - 1947)

 

José Bernardo Cardoso Junior nasceu na cidade portuguesa de Coimbra e foi o primeiro artista Naïf a ter seu trabalho reconhecido no Brasil, já dentro do período de inclusão do termo Primitivo (Naïf) no meio da produção das artes brasileiras no século XX. Cardisinho veio para o Brasil com a família com apenas três anos de idade. Mais tarde perdeu a mãe e o irmão num naufrágio perto da cidade do Rio de Janeiro, fato que marcou toda a vida do artista e sempre que tinha oportunidade lembrava do fato ocorrido.

O jovem artista queria de início ser padre e frequentou o seminário do Rio Comprido, algum tempo depois, foi estudar na cidade de Roma, Itália e conseguiu se formar em filosofia, porém, renunciou a vocação religiosa e regressou ao Brasil, onde ministrava aulas como professor.

Em 1931, assim como Rousseau, Cardosinho só começou a sua carreira de artista após a aposentadoria, já com setenta anos e recebeu incentivo de outro artista brasileiro Portinari, que muito considerava o trabalho do artista e até chegaram a expor juntos num mostra no Palace Hotel, então sede da Associação dos Artistas Brasileiros.. Cardosinho iniciou, trilhando um caminho muito comum entre muitos artistas Naïfs do mundo inteiro, ou seja produzindo em fase avançada da vida. Sua pintura chamava atenção de muitos artistas famosos e intelectuais, como o pintor Foujita, com quem chegou a trocar obras. A produção de Cardosinho era feita de forma diferente de outros artistas, ele buscava inspiração não na natureza, mas em cartões postais, fotos de jornal e revistas ilustradas, partindo dos temas selecionados ele produzia uma pintura de firme pincelada, com bom desenvolvimento do desenho e da perspectiva. Seus temas eram ligados a realidade, porém tingido de cores fortes e cheias de vida, que infelizmente não temos a completa impressão de como eram, pois as tintas nacionais que ele utilizava eram de baixa qualidade e perdem sua iluminosidade com o tempo. Alguns quadros pintados por ele chamam a atenção por misturar paisagens, como o Pão de Açucar no Rio de Janeiro, com naturezas mortas e borboletas numa mesma obra, algo pouco comum até mesmo entre os Acadêmicos e os Modernos. No caso das borboletas, dados apontam que ele tirava como modelo boboletas reais que fixava na parede de seu ateliê.

Muitos dados pesquisados mostraram que ao longo da vida Cardosinho produziu mais de seicentos quadros de excelente qualidade, porém se é 197 verdede, grande parte de sua produção se perdeu, pois restaram poucos, mantidos por colecionadores ciumentos. Duas obras merecem destaque: uma está no acervo da Tate Gallery de Londres e a segunda está na coleção do Museum of Modern Art de New York (MOMA). O legado que Velho Cardosinho nos deixou abriu caminho para a consolidação da arte Naïf brasileira, mostrando que o sucesso e o reconhecimento do valor artístico era possível.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

HEITOR DOS PRAZERES, A PRAIA, 1965

ORIGEM: http://pintores.folha.com.br/heitor_dos_prazeres-volume_28.html

 

 

Heitor dos Prazeres (1898 - 1966)

 

Heitor dos Prazeres é um caso único na história da pintura Naïf Brasileira, ele conquistou sucesso em duas profissões como artista Naïf e como músico. As artes que ele prosuziu ao longo de sua carreira estão intimante ligadas uma com a outra, as músicas de samba que compôs foram retratadas também por seus pincéis. Ele está ao lado dos primeiros Naïfs brasileiros a ter o trabalho reconhecido no período de introdução do termo em solo nacional, no século XX.

Heitor dos Prazeres nasceu na cidade do Rio de Janeiro, num período de profundas transformações na sociedade e na própria cidade, e ele era um típico carioca, passou toda a infância convivendo em um ambiente carnavalesco da Praça Onze e o Mangue. Após a escola primária foi tipógrafo, sapateiro, alfaiate, carpinteiro, até conseguir um cargo como funcionário público.

Já praticava cavaquinho com oito anos de idade, quando adulto se tornou um grande compositor de samba e compôs vários sambas famosos, entre seus sucesso está o Samba Pierrô Apaixonado. Seu profundo envolvimento com o samba e o carnaval ajudou a fundar algumas escolas de samba, entre elas a famosa Mangueira verde rosa.

Começou a pintar após a morte da mulher, em 1937. Assim como na música, ele iniciou na pintara de forma autodidata e apenas para decorar as paredes, fase que ficou muito famosa na época. Levou para as telas os temas que eram familiar a sua vida, como o samba, as mulatas, as cenas de camdomblé, as macumbas, os espiritismo, as cenas dos moradores do morro e das praias afastadas da cidade do Rio de Janeiro e toda a boemia da noite.

Durante a pesquisa encontrei até dois auto retratos do artista, mantidos na coleção G. Chateaubriand. Um das obras ele se retrata como pintor, pintando uma paisagem debaixo de uma árvore, no outro como copositor, sentado na mesa com um violão, caçacha na taça e lápiz e papel na mão, ao lado a musa inspiradora dorme tranquila na cama.

Ele participou das primeiras Bienais Internacionais de São Paulo, na década de 1950, onde ganhou prêmios e até a Rainha da Inglaterra chegou a comprar uma de suas obras.

Heitor dos Prazeres é um dos artistas mais famosos da produção nacional, representou como poucos artistas a cultura e a arte do Samba num período de crescimento e de conquista de espaço dentro da cidade do Rio de Janeiro, fazendo parte e lutando por essa conquista, não satisfeito em ser um grande compositor, ainda nos deixou de legado uma rica produção de pintura Naïf.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Chico da Silva - O grande pássaro - (1966)

ORIGEM: http://www.museunaif.com/a/mian-naif-uma-viagem-na-alma-brasileira/

 

Chico da Silva (1910 - 1985)

 

Francisco Domingos da Silva nasceu na cidade de Alto Tejo, interior do estado do Acre, seu pai era índio peruano e sua mãe brasileira, ele foi considerado um dos maiores fenômenos da pintura Naïf nacional, porém muito mais conhecido na Europa do que em solo nacional. Ele marcou a história da arte univesal com a sua pintura de animais fantásticos.

Quando tinha seis anos de idade se mudou com a família para a cidade de Fortaleza no estado do Ceará. Foi ainda na infância que seu dom artístico começou a despertar. Gostava de desenhar animais fantásticos, nos muros e nas paredes dos barracos dos pescadores, usando carvão, pedaços de tijolo vermelho e folhas de árvores para desenhar peixes, cobras, pássaros, dragões e seres imagiários, beirando o surrealismo. Em 1937, os trabalhos do jovem Chico da Silva chamam a atenção do artista Suíço Jean Pierre Chabloz, que na época vivia na cidade de Fortaleza. Foi Chabloz que deu apoio ao jovem, ensinando a utilizar as tintas e o pincel, primeiro fazendo experiências com a tinta guache e depois com outros tipos de tinta. Após um período de laboratório, Chico da Silva passou as imagens dos animais fantásticos para a tela, sendo pintada com tinta industrializada e misturas próprias, o resultado foi tão bom que em 1943 já plenejavam promover uma exposição individual de Chico, no mesmo ano ele participa do Salão de Abril de Fortaleza.

Ele continuaria pintando a guache e produzindo seus animais fantásticos, mágicos e surrealistas, se não bastasse isso ele ainda tinha uma grande variação de cores, quentes e frias, que dão mais vida a obra do artista. Os animais geralmente eram coloridos com vários pontos de cores, mostrando várias técnicas e estilos dentro da produção de um mesmo artista.

Após o período da 2ª Guerra Mundial Chico da Silva participa do Beauregard (Exposição coletiva) de Genabra na Suíça em 1949. Em 1952, Chabloz publica em Paris o ensaio Um Índio Brasileiro Reinventa a Pintura. Em 1956, participa da exposição coletiva de Arte Folclórica e Popular, Realizada pelo Museu Etnográfico de Neuchâtel. Em 1966, recebe a Menção Honrosa na 33ª Bienal de Veneza, Itália. Com tantas atividades importantes na Europa não é de admirar que ele ficasse famoso no velho continete.

Muitos especialistas e livros consideram os animais fantásticos de Chico da Silva fruto das tradições orais e da própria mitologia indígena da região da Amazônia, alguns animais existem de verdade, mas eram desconhecidos ou ignorados pelos europeus e brasileiros das grandes cidades.

Chico da Silva Falece na Cidade de Fortaleza em 1985. André Malraux o qualificou como um dos melhores artistas Naïfs do mundo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jose Antonio da Silva - Carro de Boi - 1965

Origem: http://www.catalogodasartes.com.br/Lista_Obras_Biografia_Artista.asp?idArtista=320

 

 

José Antonio da Silva (1909 - 1996)

 

No dia 12 de março de 1909, José Antonio da Silva nasceu numa fazenda nos arredores da cidade de Sales de Oliveira, interior do estado de São Paulo, marcaria a historia cultural brasileira não apenas por ser um artista Naïf, o que já seria o suficiente pelo talento mostrado em suas obras, mas também por ser o primeiro lavrador brasileiro a publicar cinco livros, entre eles o Romance de minha Vida, publicado em 1949 e editado pelo Museu de Arte Moderna de São Paulo, uma clara auto biografia.

Na pintura é considerado como um “expressionista” da pintura Naïf brasileira, era filho de produtores agrícolas e trabalhou durante muitos anos nas lavouras até ser descoberto como artista, e é essa vivência íntima com o trabalho na lavoura que ele iria transferir para os temas de seus trabalhos.

Em 1946, o jovem José Antonio da Silva tinha acabado de se mudar para a cidade de São José do Rio Preto, também interior do estado de São Paulo e logo conseguiu um trabalho de porteiro noturno num hotel do centro da cidade, tinha se estabelecido na cidade e agora tinha algum dinheiro para investir no seu talento. Quando criança já desenhava e fazia seus primeiros trabalhos, porém, com pouca instrução teria que esperar até a vida adulta para se dedicar a arte. Vencida as primeiras dificuldades, ele tomou coragem comprou dois metros de tecido de flanela, algumas tintas a óleo e dedicou suas horas vagas pintando seus primeiros temas sobre aquele tecido, o resultado foram três quadros e esses utilizou para se inscrever no Certame de Belas Artes da Casa de Cultura de São José do Rio Preto. Alguns livros dizem que o jovem artista recebeu o Primeiro Prêmio, outros dizem que os jurados não conseguiram fazer com que ele ganhasse o Primeiro Prêmio, apesar de merecer. O júri foi composto por Paulo Mendes de Almeida, Lourival Gomes Machado e João Cruz, que ficaram muito impressionados com a originalidade e a força expressiva contidas nas obras do artista e o incentivaram a continuar.

As obras de Jose Antonio da Silva, que participaram dessa primeira exposição rompiam com as técnicas tradicionais, ainda utilizadas pelos artistas do interior de São Paulo. Ele se destacou pela luminosidade das cores utilizadas e rompia com os efeitos de luz e sombra, seus personagem não tinham sombra e os temas eram bem brasileiros ligados a paisagem e ao trabalho na lavoura, características comuns na pintura Naïf contemporânea, mas que na época causavam forte impacto.

Os visitantes e jurados se perguntavam como aquele homem de pouca instrução, que provavelmente não tinha contato com a produção de pintura feita na Europa da época sabia pintar daquela forma tão inovadora e de forma tão espontânea? Muitas vezes os especialistas fazem essas perguntas para muitos casos de pintores Naïfs do mundo inteiro, a resposta é que o individuo humano pensa e logo tem a necessidade de se expressar de qualquer forma possível, as vezes o resultado é uma pintura fora dos padrões estabelecidos dentro de uma norma culta e dentro da sociedade onde o artista vive.

Dados apontam que os jurados da exposição conseguiram para o artista uma exposição na Galeria Domus, na cidade de São Paulo, em 1949, algo incomum, pois o jovem artista era praticamente desconhecido do grande público.

Ele continuou produzindo suas pinturas abordando paisagens rurais, com plantações de algodão e café, que hoje são considerados clássicos da pintura Naïf brasileira, porém sua produção não ficou restringida apenas nesses temas ele passou a pintar outras temáticas, como naturezas mortas, trem de ferro cortando as paisagens de plantações, procissões, marcha pela paz, temas sacro popular, como São Jorge matando o Dragão, Cristo no calvário da Cruz, trabalhadores cortando árvores na mata, até temas históricos como os escravos brasileiros sendo castigados e torturados. Podemos classificar a obra de José Antonio da Silva como uma das mais ecléticas dentro da produção nacional.

O talento do artista abriria caminho para a participação das suas obras na I, II, III, VI,VII e IX Bienais de São Paulo, tendo obtido o Prêmio de Aquisição em 1951 e Inseção de Júriem 1961. No exterior merece destaque as participações na XXVI e XXXIII Bienais de Veneza, na última com Sala Especial.

Em 1970, o artista cria o Museu de Arte Contemporânea de São José do Rio Preto, onde o acervo permanente preserva várias obras do artista e de outros artistas Naïfs do Brasil, ele comprou várias peças barrocas no Sertão do Estado de Goiás, um Carro de Boi e toda a variedade de peças antigas, assim criou algo que na época, nenhum outro museu tinha, um acervo preservando a identidade cultural do interior do Brasil.

A casa de Jose Antonio da Silva em São José do Rio Preto era muito famosa, pois ele pintou nos muros quarenta temas, vinte tratando da história do Brasil, vinte com o tema inspirado em sua própria vida. Nosso grande artista foi um dos poucos artistas Naïfs do mundo a receber o sucesso e o reconhecimento de sua obra em vida, muitos museus mantém em seus acervos obras dele, como o MASP (Museu de Arte Moderna de São Paulo), o MIAN (Museu Internacional de Arte Naïf do Brasil) e o Museu de Arte Moderna de New York. Ele trabalhou arduamente durante toda a vida e bem mereceu o sucesso que conquistou, só parou de trabalhar aos 85 anos, pouco antes de sua morte em São Paulo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Maria Auxiliadora da Silva - O Baile - (1970)

Origem: http://www.galeriaestacao.com.br/artista/33#prettyPhoto[GalArtista]/1/

 

Maria Auxiliadora (1935 - 1974)

 

Maria Auxiliadora da Silva é uma das artistas Naïfs brasileiras que tenho uma enorme admiração, tudo na vida dela me comove e me facina, é sem sombra de dúvidas, uma artista na qual eu me espelho e sua obra chega a me influênciar como artista Naïf, mesmo tendo falecido dez anos antes de eu vir ao mundo, mas a biografia deve começar pelo início.

Maria Auxiliadora nasceu na cidade de Campo Belo, estado de Minas Gerais, no dia 24 de maio de 1935, era a quarta filha de uma família de 18 irmãos. O despertar da arte se deu em meio familiar. Dona Maria, como era conhecida a mãe da artista, era dona de casa, escultora, pintora, e trabalhadora braçal da Estrada de Ferro Oeste de Minas Gerais. Dona Maria sempre incentivou os filhos a se expressarem por meio da arte, mas a vida era muito difícil e logo a família teve que se mudar para a cidade de São Paulo em busca de melhores ocupações e condições de vida.

A cidade de São Paulo já era uma grande metrópole na década de 1940, quando a família se mudou, logo foram morar em um bairro afastado do centro. A jovem Maria Auxiliadora ajudava a mãe a tingir os fios que utilizava para fazer os bordados de encomenda e nas horas livres brincava rabiscando naturalmente figuras nos muros e nas paredes da casa onde morava, tinha que ajudar a família, pois eram muito pobres e frequentou a escola por volta de três anos, logo começou a trabalhar fora, sempre vigiada pela mãe, pois a saúde da artista era frágil, dados apontam que com 22 anos a artista foi submetida a sua primeira cirurgia.

Maria Auxiliadora teve trabalhos humildes e muito dignos, trabalhou como bordadeira por encomenda, passadeira de roupas, empregada doméstica, assim como aconteceu com vários outros artistas, a dupla ocupação acaba sendo retratada na obra da artista de várias formas, o trabalho de doméstica é tema de algumas obras, enquanto em outras os personagens tem as roupas bordadas ou com renda. Um bom exemplo é a obra Jantar, pintada em 1973, onde ela aparece personalizada não apenas na figura da empregada doméstica que serve a família no centro da obra, mas ela está representada na figura da cozinheira e da babá cuidando das crianças, sempre que a artista se autoretratava pintava o personagem com uma pinta na bochecha, ela também é uma das muitas artistas naïfs que utilizam a escrita na obra.

Muitos especialistas consideram que a artista revolucionou o mundo das artes. Primeiro por que ela criava um tipo de textura que aplicava nas telas, formando camadas, fazendo com que seus personagens tivessem seios e nadegas, tornando a obra quase tridimencional, não bastando isso ela cortava seus próprios cabelos para colar nas cabeças dos pequenos personagens que criava, como se a pintura se transformasse numa boneca. Ela era autodidata, pois nunca teve nenhum tipo de orientação profissional, compensava isso produzindo uma pintura muito rica e colorida, diferente de muitos artistas Naïfs, Maria Auxiliadora pintava suas telas de preto e de cores fortes, depois os detalhes eram colocados de outras cores variadas e no final tudo era contornado de branco, como se ela estivesse clariando sua pintura. No caso dos outros artistas, como é o meu caso, pinto todo o plano de fundo de cores variadas e por último contorno não de branco, mas sim de preto. Os temas eram bem ecléticos, iam de festas populares, procissões, trabalhadores agrícolas, quintais, desfiles de escola de samba, bares, descanso nos parques e praias, bailes, sereias, orixás, temas natalinos e a vida doméstica.

Na década de 1950, a artista se reuniu com outros integrantes da família que também pintavam e juntos se encontravam com o grupo que girava em torno do músico, teatrólogo e poeta Negro Solano Trindade, na cidade de Embu, interior de São Paulo, onde começava a surgir um centro de artesanato, voltado principalmente para a cultura popular e de origem africana. Logo a cidade de Embu começou a chamar atenção nos jornais e atrair visitantes para compras e atraindo junto com eles os pseudos Hippies e pela arte industrializada, não gostando dessa transformação Maria Auxiliadora logo retornou a capital e a expor junto com a família.

Em 1967, na Praça da República, Maria Auxiliadora conheceu alguns admiradores como o Físico e Crítico de Arte Mário Schemberg, que a apresentou ao Cônsul dos Estados Unidos, Alan Fisher. Em 1971, Alan Fisher, que gostava muito da jovem artista, ajudou a organizar uma exposição individual de Maria Auxiliadora na Galeria USIS do Consulado Americano em São Paulo, a exposição foi um sucesso e ela reuniu nessa exposição vários artistas Naïfs da Praça da República e alguns que promoviam exposições em cidades do interior do Estado de São Paulo. Foi nessa exposição que a artista teve seu primeiro contato com Pietro Maria Bardi, critico de arte e incentivador de vários artistas Naïfs brasileiros. Pietro Maria Bardi escreveu na década de 1970 o livro intitulado Maria Auxiliadora da Silva, onde conta a biografia da artitista.

Agora com a estabilidade financeira um pouco mais tranquila ela conseguiu comprar uma pequena casa, no Bairro da Casa Verde, na cidade de São Paulo, perto da família, e voltou a estudar, pois sempre foi seu desejo conseguir obter instrução que não teve quando criança, pintando durante o dia e reservando as noites para freqüentar o curso Mobral no Centro de alfabetização de adultos Beato Marcelino Champagnat, mantido pela Associação de Pais e Mestres do Colégio Arquidiocesano de São Paulo, onde ela conseguiu se formar no quarto ano em 1972, agora conseguia ler e escrever. A dura rotina dos estudantes que trabalhavam de dia e estudavam de noite foi retratado na obra MOBRAL pintada em 1974, onde vemos um grupo de alunos estudando a tabuada, o plural e fazendo contas de divisão.

O sucesso conquistado pela exposição da galeria USIS, corria o risco de ser momentâneo, mas com a intervenção de Werner Arnhold, do consulado Americano de São Paulo, logo ela teria o reconhecimento do seu valor artístico em terriório nacional e internacional, pois através dele que a artista conseguiu expor nas Feiras de Arte de Basiléia, Dusseldorf e Paris, tornando o trabalho de Maria Auxiliadora conhecido na Europa onde também conquistou alguns colecionadores de suas pinturas.

A passagem pela vida e o sucesso profissional seriam tão rapidos, que o destino pareceia prever que o talento de Maria Auxiliadora tinha que ser conhecido rápido, pois a vida dela foi breve, logo foi descoberto um câncer no pulmão, e a artista começou a fazer tratamento, foi nesse período em que ela começou a cortar seus próprios cabelos para colar nos personagens que pintava, talvez uma forma de prolongar sua existência na terra. O medo da morte iria mudar os temas das obras de forma radical, e é notável quando ela retrata uma ambulância pintada na obra Morro dos Coqueiros e posteriormente na obra Ambulância de 1973. Novamente o medo da morte foi retratado em várias obras onde ela é o personagem principal, recebendo a última unção, onde se autoretrata na cama rodeada pela família, seu próprio velório na obra Velório da Noiva e além de seu enterro na obra Enterro da Mesma, pintado em 1973.

No ano seguinte o câncer se espalhou por outras áreas do corpo se tornando generalizado, a família tentou de tudo para salvar a artista apelando até para rituais de curandeiro, ela no entanto pintou até o último suspiro. No dia 20 de Agosto de 1974, com trinta e nove anos de idade Maria Auxiliadora vem a falecer de câncer generalizado. Debaixo de seu travesseiro foi encontrado um desenho inacabado.

Maria Auxiliadora da Silva nos deixou como legado não apenas a sua produção artística, ela teve um começo de vida pobre, empregada doméstica, mulher, negra, e analfabeta, tinha todas as características para ser marginalizada e excluída pela sociedade da época, mas não abaixou a cabeça e foi à luta. Ser artista plástica é só mais um motivo para que tenhamos ainda mais orgulho dela. Hoje, que o trabalho de empregada doméstica foi oficialmente reconhecido pelo gorverno como profissão, com registro na carteira de trabalho e vários benefícios concedidos aos profissionais da categoria, eu me pergunto: O que ela diria? Aposto que ficaria ainda mais orgulhosa de todos os passos que deu na vida.

O legado artístico de Maria Auxiliadora se mantém vivo no trabalho de três irmãos da família Silva, Efigênia Rosária Silva (1938), Conceição Silva (1938) e João Candido Silva (1933), todos nasceram na cidade de Campo Belo no Estado de Minas Gerais, são artistas Naïfs, valorizam a identidade cultural Afrobrasileira e , assim como Maria Auxiliadora, são um orgulho para a produção de Arte Brasileira.

No Final de 2013 tive a grande oportunidade de visitar os três irmãos que  ainda moram no Bairro da Casa Verde em São Paulo, moram no mesmo endereço, cada um em sua casa e um ao lado do outro como uma grande família, e tive a oportunidade de ver a importância da arte Naïf para a fammília , que me contou sobre a dificuldade de manter a atividade na Praça da República, as conquistas e exposições que andavam realizando, foi incrível.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Waldomiro de Deus Pintando 

Origem: https://www.facebook.com/waldomirodedeus/photos

 

Waldomiro de Deus (1944 - )

 

Waldomiro de Deus nasceu em 12 de junho de 1944, em Itajibá, no sul do estado da Bahia, região árida do sertão e teve uma infância difícil e pobre, mas cheia de riquezas culturais, convivendo em meio a natureza, as festas populares e o riquíssimo folclóre da região. Assim como outros artistas Naïfs, para ajudar na renda da família, Waldomiro de Deus trabalhou na primeira infância, junto com o irmão na lavoura de feijão e batata e nas horas vagas desenhava bichos e plantas pintadas de lápis de cor. Em 1956, então com 12 anos de idade, cansado da vida dura e sem perspectiva de melhora descidiu sair de casa em busca de condições melhores. Na época, muitos vizinhos da família migravam para o sudeste, esperando trabalhar nas grande metrópoles de São Paulo e Rio de Janeiro. O jovem Waldomiro se despediu da mãe e logo conseguiu uma carona de jipe para a cidade de Nanuque, interior do estado de Minas Gerais, lá trabalhou por algum tempo como carregador de malas e ficou morando nas ruas. Sentiu saudade de casa e vontade de voltar, mas persistiu e logo conseguiu um trabalho de ajudante numa padaria, onde fazia a faxina e dormia perto do forno.

Estava claro que naquele local ele não conseguiria tornar o sonho de uma vida melhor em realidade, então ficou sabendo de um caminhão que iria levar várias pessoas para a cidade de São Paulo e descidiu ir junto. Em 1958, Waldomiro chega a cidade de São Paulo, uma tarde fria de inverno. Sem trabalho e sem conhecer ninguém na cidade ele passa as primeiras noites dormindo nos bancos dos parques e praças, até que conheceu o guarda civil Manoel Pompeu, que era casado e tinha crianças mais novas que Waldomiro. O guarda convidou Waldomiro para morar junto com sua família, em Osasco, então bairro de São Paulo. Waldomiro aceitou o convite e conseguiu um local seguro para se estabelecer na cidade.

Na nova casa Waldomiro tinha a função de dar café para os filhos do casal, e levar para a escola, depois ele ia ao Largo de Osasco engraxar sapatos, local onde aprendeu a ler e escrever com outros meninos de rua. Nesse período para ganhar mais algum dinheiro ele também trabalhou como panfleteiro e garçom, sempre desenhando nas horas vagas. Com 17 anos ele conseguiu um trabalho como jardineiro na casa de Pierre Zacoppe, um imigrante italiano. Ele foi contratado e passou a morar na casa dos fundos no trabalho. Com os primeiros pagamentos ele comprou tinta guache, cartolina e pincel. Então trabalhava de dia e desenhava e pintava de noite, isso fez com que a atividade noturna começasse a interferir no seu trabalho diário e passou a acordar tarde, logo foi despedido. Waldomiro pegou seus desenhos e começou a andar sem destino pelas ruas de São Paulo.

Na região do Viaduto do Chá uma ventania levou os seus desenhos e o estilo de pintura chamou a atenção de um turista americano, que ficou encantado com a pintura onde valorizava as imagens do folclore brasileiro e comprou dois trabalhos do jovem artista. Naquele momento tudo mudou na vida de Waldomiro, ele começou a olhar para o futuro com alguma perspectiva de melhorar sua condição, tendo um futuro mais tranquilo e garantido. Ele então espalhou seus desenhos pelo chão e logo chamou a atenção do compositor Teodoro Nogueira, que levou o jovem para a redação do Jornal A Gazeta, onde conheceu o folclorista Rossini Tavares de Lima, que comprou algumas pinturas de Waldomiro, com esse dinheiro ele conseguiu alugar um pequeno quarto perto do Centro Velho de São Paulo, onde morou por algum tempo. Em 1962, recebeu um convite para participar no Parque de Exposições da Água Branca, primeira feira de Artigos Típicos Brasileiros (ARTIP), na feira ele vendeu alguns trabalhos e conheceu o decorador Marques Terry Della Stuffa, que se tornou o protetor do artista, que logo foi morar no quarto dos fundos da casa do decorador, continuando a produzir suas pinturas, em pouco tempo tinha a quantidade suficiente para fazer uma exposição do própria e apresentara sua pintua para a elite Italobrasileira da cidade de São Paulo.

Em 1963, Waldomiro conhece o físico e crítico de arte Mário Schenberg, que o incentivou a renovar a sua pintura com temas mais contemporâneos, e menos folclórico e decorativo, isso fez com que Waldomiro entrasse em conflito com o decorador, ele teve que se retirar da casa de Stuffa e se mudar para a região da famosa Rua Augusta, num pequeno quarto nos fundos de um restaurante. A Augusta é uma badalada rua que corta a Avenida Paulista, onde transitavam as figuras mais renovadoras, da moda e das influências vindas da Europa e dos Estados Unidos, que também tinha vários estabelecimentos como as badaladas casas noturnas, lojas estravagantes e era uma passarela ao ar livre da moda da época, que o jovem artista adorava, como os ternos com camisas de estampas floridas.

A primeira exposição individual de Waldomiro de Deus aconteceu em 1964 e com a venda dos quadros comprou um terreno em Osasco, onde construiu sua primeira casa. Em 1966, participa do XV Salão de Arte Moderna de São Paulo, onde ganha menção honrosa e sem saber o que queria dizer isso, Waldomiro ao ler a placa com os dizeres “Menção Honrosa” colocada ao lado de sua obra, pensou que aquilo o desqualificava perante aos outros trabalhos, que não tinham o mesmo valor artístico, porém o crítico Mário esclareceu que aquilo era uma honra ao trabalho e talento do artista.

Nesse período é que Waldomiro de Deus passa a expor na Praça da República aos domingos e por meio de uma aposta, desfila na rua Augusta usando uma minissaia, é agredido e vira matéria de jornal, suas obras passam a ser polêmicas ao pintar cenas de personagens nus, de questionamentos políticos, de apocalipses, e pinta a famosa Nossa Senhora de Minissaia, que escandalizou a sociedade da época, pois a minissaia era uma roupa ligada as prostitutas que circulavam a região do centro velho, por causa da pintura recebeu ameaças e foi convidado a prestar esclarecimentos junto a censura da época. Na mesma década acontece a chegada do homem a Lua e Waldomiro pinta as cenas de foguetes e astronautas chegando em outros planetas, que marcam a época.

No final da década ele viaja a Europa para ampliar seus horizontes. Em 1967 vai para Paris com uma carta de apresentação do Crítico Mário Schenberg para a sua filha, Ana Clara que morava na capital francesa. Em Paris logo foi organizada uma exposição de suas telas, que teve a ilustre visita do artista espanhol Salvador Dalí, que elogiou as pinturas do artista brasileiro. Waldomiro fez muitas exposições na Europa, principalmente na França e na Itália, fazia muito sucesso e os europeus gostavam muito das coloridas pinturas do artista brasileiro. No Brasil, por causa da ditadura militar, muitos artistas brasileiros estavam exilados na Europa e Waldomiro conheceu muitos deles, chegou a morar com o cantor Geraldo Vandré. O artista viajava pela Europa e voltava ao Brasil por temporadas, sempre chamando muito a atenção pelo seu estilo inovador de se vestir, misturando tendências da Europa com acessórios brasileiros. O país mais importante que Waldomiro passou foi Israel, onde ele morou 14 meses, a influência cultural foi tão grande que ele deu aos seus filhos nomes em hebraico.

No Brasil, foi construida uma casa de 15 comodos na cidade de Osasco, onde a família de Waldomiro morava, todos vindos da Bahia. Na casa funcionava seu ateliê e era famoso por ter comprado um caixão, pois o artista queria pintar uma pessoa dentro. O ateliê era muito famoso na cidade, pois tinha uma decoração muito particular, com flores de papel, bonecas de pano, Santos, tambores, fotos de artistas da Praça da Republica, das viagens pelo mundo, aranhas secas, caveiras de cachoro, chifres e outras curiosidades.

Em 27 de março de 1976, Waldomiro de Deus se casa com a vizinha Maria de Lourdes de Deus, na Igreja Batista de Vila Yara, a esposa do artista seria uma futura artista Naïf, tão famosa quanto o companheiro. Nos anos posteriores ao casamento Waldomiro passa a expor menos no exterior e mais pelos estados do Brasil, conhecendo profundamente a realidade social dos brasileiros, levando para suas telas temas que falam das dificuldades sociais, da pobreza, da corrupção, com uma produção de forte característica de denuncia social. Os temas da pintura também mudam, pois após o casamento passam a ser mais espirituais e fantásticas, retratando milagres até a série de planetas imaginários criados pelo artista, são novos mundos. Uma exposição merece destaque: Em 1979, Waldomiro de Deus promoveu uma badalada mostra individual, no Eron Brasília Hotel, entre os visitantes compareceram o cineasta Glauber Rocha e o então Presidente do Brasil João Batista Figueiredo, que ficou impressionado e fez muitos elogios ao trabalho do artista, isso contrasta com a realidade das relações do governo com a produção artística do período, cheia de censuras e envio de artistas par o exlio, que eram contra a ditadura militar, para o exílio no exterior. Era o periodo do “Brasil, Ame-o dou deixe-o”.

Por casusa de suas viagens pelo Brasil Waldomiro conheceu a cidade de Goiânia, capital do estado de Goiás, que o encantou, um estado verde, com forte vocação para a agricultura e pecuária e tradição da música caipira. Em 1990, ele vende sua casa em Osasco e se muda para Goiânia, onde vive até hoje, sua casa é visitada por personalidades, políticos, produtores culturais e está sempre cheia de gente, é um ponto turístico da cidade. As pinturas de Waldomiro de Deus são coloridas e contornadas por grossos traços pretos, pra muitos lembram vitrais de igreja e ao longo do tempo passaram a ficar mais limpas dos detalhes, com o tema centralizado e direto. Nos anos seguintes suas pinturas ficam cada vez mais críticas e coloridas, com temas que criticam a corrupção na política, direitos humanos, reforma agrária, senas de apocalipse e de renovação, sempre povoadas por anjos e peixes, indo até a temas relacionados a problemas contemporâneos como a pintura feita em 1995 para a campanha de prevenção da Aids (HIV). Na pintura de Waldomiro, também encontramos a valorização da missigenação étnica brasileira, onde seus personagens são negros, brancos e na maioria mulatos, como ele mesmo afirma que serão a maioria dos brasileiros num futuro próximo.

 

 

 

 

 

 

 

 

CASA EM PARATI

12 IMAGENS SUPERIORES: ENTREVISTA DA DJANIRA PARA A REVISTA O CRUZEIRO - 21 DE JUNHO DE 1962

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